quinta-feira, 22 de fevereiro de 2007

CAMINHADA

Gosto de fazer caminhadas. Nas cidades que chego, no campo, nas montanhas e na praia. È muito bom caminhar. Faz bem para a saúde, corpo e mente.

Sair sozinho ou com alguém para conversar sobre a geografia do lugar que está se vendo ou sobre a “geografia das pessoas”, como dizia Érico Veríssimo, que muitas vezes criava daí seus personagens, como conta eu seu livro de memórias Solo de Clarineta.

Pois bem, palmilhei a Avenida Assis Brasil, bairro Três Vendas, em Pelotas-RS. É uma avenida curta, talvez com um quilômetro de extensão, sem pavimento, com canteiro central e pouco arborizada. Há algumas grandes figueiras na frente das casas, e no canteiro central um morador tenta salvar pequenos cinamomos, recém plantados, das vorazes formigas cortadeiras, amarrando sacos plásticos nas bases dos pequenos troncos. A avenida começa na Fernando Osório, importante via de acesso à cidade para quem vem de Porto Alegre e termina numa via asfaltada junto ao muro do aeroporto, cujo nome não consegui identificar.

Logo na entrada há uma casa tipo colonial, ampla, com pátio arborizado, flores, um jardim imenso, toda cercada. Para mim, um indicativo claro do que foi e ainda é a cidade em termos aristocráticos.

Do outro lado uma velha indústria de compotas (frutas e legumes em conserva), coisa bem típica da região. A fábrica está abandonada, importante isso, em ruínas. Ainda se vê os prédios caindo, muros, chaminés e um detalhe que chama atenção, em uma parede mais alta, da caixa d’água talvez, a pintura de uma bandeira da Argentina. Me contaram que no passado fora uma fábrica, cujos proprietários eram imigrantes alemães e que durante a II Guerra Mundial foi atacada, apedrejada pelos moradores e próprios funcionários. Tudo isso causado pela propaganda anti-nazista. Para os fanáticos quem era alemão, era nazista. Conta-se que havia um valão no meio da rua e este ao final do ataque resultou entulhado com latas de pêssego, figo e outras frutas e legumes. Mais tarde um empresário argentino comprou a empresa, imprimindo a bandeira da Argentina.

Seguindo em frente uma série de casas de classe média com magníficos exemplares de alamandras, bugan villes e hibiscos, colorindo os jardins. Do outros lado uma casinha típica de favela. Ao lado uma igreja. Andando mais um pouco vê-se oficinas, pequenas fábricas, depósitos, um pequeno boteco de bairro - com mesa de “mini-sinuca”, salão de beleza, etc.

Há cães e gatos pelas ruas disputando restos de lixo e preás que vivem no capim ao longo de valas onde corre o esgoto. Meninos jogando bola e andando de bicicleta.

Lá no fim, junto a avenida asfaltada, ao lado do aeroporto, uma grande e bem organizada, pelo menos é o que parece, transportadora a indicar que o futuro está por ser feito.

Pelotas já foi a cidade do charque. Umas das mais importantes, senão a número um do Rio Grande do Sul. Hoje luta contra o desemprego, a informalidade e a sub-habitação. Ainda há sobrados majestosos preservados que sobraram da época áurea em que conheceu o progresso.

Observando a Assis Brasil, sua geografia e suas gentes, mesmo rapidamente assim como eu fiz, talvez possa se ter uma idéia da cidade toda. Está ali, com um pouco de imaginação, seu passado, seu presente e indicações para o futuro.


Porto Alegre, 12 de fevereiro de 2007.
JORGE LUIZ BLEDOW